segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Seguro-saúde. Apólice. Cobertura. Negativa. Descabimento. Colocação de prótese. Exclusão. Abusividade. LF-9656 de 1998, art-10, inc-I, inc-VII. Indenização. Dano moral. Fixação. Quantum


APELAÇÃO CÍVEL. SEGURO. PLANO DE SAÚDE. CONTRATO FIRMADO ANTES VIGÊNCIA DA LEI 9.656/98. RENOVAÇÕES CONTRATUAIS SUCESSIVAS. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PROTESE. COBERTURA SECURITÁRIA DEVIDA. reembolso das despesas. DANO MORAL CARACTERIZADO.
1.         O contrato de seguro e plano de saúde tem por objeto a cobertura do risco contratado, ou seja, o evento futuro e incerto que poderá gerar o dever de indenizar por parte da seguradora. Outro elemento essencial desta espécie contratual é a boa-fé, na forma do art. 422 do Código Civil, caracterizada pela lealdade e clareza das informações prestadas pelas partes.
2.         Há perfeita incidência normativa do Código de Defesa do Consumidor nos contratos atinentes aos planos e seguros de saúde, como aquele avençado entre as partes, podendo se definir como sendo um serviço a cobertura do seguro médico ofertada pela demandada, consubstanciada no pagamento dos procedimentos clínicos decorrentes de riscos futuros estipulados no contrato aos seus clientes, os quais são destinatários finais deste serviço. Inteligência do art. 35 da Lei 9.656/98. Aliás, sobre o tema em lume o STJ editou a súmula n. 469, dispondo esta que: aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.
3.         O objeto do litígio é o reembolso dos valores despendidos para o pagamento da prótese necessária ao procedimento cirúrgico a que se submeteu a autora, bem como indenização por danos morais devido à negativa securitária. 
4.         No presente feito há a incidência da legislação atual atinente aos planos e seguros privados de assistência à saúde, em razão da adequação do contrato a esse regramento jurídico, pois em função do caráter de ordem pública deste, as normas em questão têm aplicação imediata ao caso em concreto.
5.         A exclusão de prótese e/ou órtese de qualquer espécie essenciais ao procedimento clínico realizado, estabelecido no contrato firmado entre as partes é abusiva, conforme definido no art. 10 da Lei n.º 9.656/98, violando o disposto no inciso IV do art. 51 do CDC, salvo se empregadas para fins estéticos ou não ligadas ao ato cirúrgico.
6.         Entretanto, não há se falar em aplicação do artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, porquanto o consumidor não foi cobrado pela ré em quantia indevida. Assim, não restou preenchido o suporte fático para incidência da mencionada regra.
7.         Ressalte-se que a relação jurídica avençada no caso dos autos desborda da idéia tradicional de contrato no qual há simples comutatividade de prestações, com vantagens e obrigações recíprocas, na hipótese dos autos se paga pela tranqüilidade, a fim de garantir incerteza futura quanto a bem inestimável, no caso a vida, pois restabelecimento da plena saúde é o resultado esperado, logo, discutir a contrato sem justa causa com o fim de protelar o cumprimento da obrigação, importa conduta ilícita que merece imediata reprimenda e reparação.
7.         Relava ponderar, ainda, que os paradigmas atinentes ao regular cumprimento deste tipo de contrato foram ultrapassados, resultando em efetivo prejuízo de ordem moral, atingidos direitos inerentes a personalidade da parte autora, tendo em vista a frustração da expectativa de lhe ser prestado adequadamente o serviço ofertado, ilícito contratual que ultrapassa o mero incômodo.
8.         Assim, a demandada deve ressarcir os danos morais reconhecidos, na forma do art. 186 do novo Código Civil, cuja incidência decorre da prática de conduta ilícita, a qual se configurou no caso em tela, decorrente do inadimplemento injustificado da prestação devida, atitude abusiva na qual a ré assumiu o risco de causar lesão à parte autora, mesmo de ordem extrapatrimonial, daí ensejando o dever de indenizar. Aliado ao fato de que também se encontra presente a hipótese de incidência da responsabilidade objetiva, a teor do que estabelece o art. 14 do CDC, pois a prestação de serviço deficitária importa no dever de reparar, na medida em que o modo pelo qual foi prestado aquele e o resultado decorrente deste atingiram a esfera físico-psíquica da parte autora, fato que prescindi de culpa
9.         No que tange à prova do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza compensatória, minimizando de forma indireta as conseqüências da conduta da ré, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita da demandada que faz presumir os prejuízos alegados pela parte autora, é o denominado dano moral puro.
10.       O valor a ser arbitrado a título de indenização por dano imaterial deve levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem como as condições da ofendida, a capacidade econômica do ofensor, além da reprovabilidade da conduta ilícita praticada. Por fim, há que se ter presente que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado, importando em enriquecimento ilícito.
Dado parcial provimento ao apelo.

Apelação Cível

Quinta Câmara Cível
Nº 70043897990

Comarca de Porto Alegre
IZAR FABRICIO DE ALMEIDA

APELANTE
BRADESCO SAUDE S.A.

APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des. Romeu Marques Ribeiro Filho e Des.ª Isabel Dias Almeida.
Porto Alegre, 31 de agosto de 2011.


DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO,
Relator.

I- RELATÓRIO
Des. Jorge Luiz Lopes do Canto (RELATOR)
IZAR FABRÍCIO DE ALMEIDA interpôs apelação contra a decisão proferida nos autos da ação de cobrança movida em face de BRADESCO SAÚDE S.A.
Na decisão atacada (fls. 183/189) foram julgados parcialmente procedentes os pedidos para:

a) condenar a ré ao reembolso, na forma simples, da quantia paga pela autora, para aquisição do material “stent vision”, 3 unidades, qual seja, R$11.700,00, conforme resumo da conta hospitalar juntado na fl. 94, devidamente corrigido pelo IGP-M desde a data do pagamento, o qual foi efetuado em três parcelas de R$3.900,00 cada, nas datas de 04/08/2009, 04/09/2009 e 04/10/2009 (fl. 95), acrescidos de juros legais desde a citação; b) desacolher o pedido de indenização por danos morais, nos termos da fundamentação acima.

Em suas razões recursais às fls. 195/209, defendeu que a ré deve ser condenada a devolver em dobro a quantia paga indevidamente, nos termos do artigo 42, parágrafo único do CDC. Argumentou não se tratar de mero inadimplemento, mas de conduta de má-fé da seguradora na negativa. Teceu considerações acerca da análise econômica do direito. Asseverou que devido à negativa da ré, esta deve devolver em dobro aquilo que foi cobrado da consumidora.
Afirmou que é idosa e que foi submetida à uma situação de risco. Argumentou que fico apavorada quando, ao chegar ao nosocômio, foi negada a cobertura, sendo latente o dano moral. Requereu o provimento do recurso.
Contra-arrazoado o apelo (fls. 215/226), os autos foram remetidos a esta Colenda Corte de Justiça. 
Registro que foi observado o disposto nos artigos 549, 551 e 552 do CPC, tendo em vista a adoção do sistema informatizado.
É o relatório.
II – VOTOS
Des. Jorge Luiz Lopes do Canto (RELATOR)
Admissibilidade e objeto do recurso
Eminentes colegas, o recurso intentado objetiva a reforma da sentença de primeiro grau, versando a causa sobre ação de cobrança cumulada com pedido de indenização por danos morais decorrentes de negativa de cobertura securitária.
Os pressupostos processuais foram atendidos, utilizado o recurso cabível, há interesse e legitimidade para recorrer, é tempestivo e está dispensado de preparo devido à gratuidade deferida (fl. 102), inexistindo fato impeditivo do direito recursal, noticiado nos autos.
                        Assim, verificados os pressupostos legais, conheço do recurso intentado para o exame das questões suscitadas.
Mérito do recurso em exame
O contrato em tela foi avençado entre as partes com o objetivo de garantir o ressarcimento para a hipótese de ocorrer a condição suspensiva consubstanciada no evento danoso previsto contratualmente, cuja obrigação do segurado é o pagamento do prêmio devido e de prestar as informações necessárias para a avaliação do risco. Em contrapartida a seguradora deve informar as garantias dadas e pagar a indenização devida no lapso de tempo estipulado, condições gerais estas previstas no art. 757 e seguintes do Código Civil.
Ressalte-se que os pressupostos do contrato de seguro de saúde são a cobertura de evento futuro e incerto capaz de gerar dano ao segurado, cuja mutualidade está consubstanciada na reparação imediata do prejuízo sofrido, ante a transferência do encargo de suportar este risco para a seguradora. Permeadas estas condições pelo elemento essencial deste tipo de pacto, qual seja, a boa-fé, nos termos do art. 422 da atual legislação civil, caracterizado pela sinceridade e lealdade nas informações prestadas pelas partes e cumprimento das obrigações avençadas.
Saliente-se que presentes as condições precitadas, deve ser feito o pagamento da obrigação assumida pela empresa operadora nos limites contratados e condições acordadas, desonerando-se aquela de satisfazer a obrigação assumida apenas na hipótese de comprovado o dolo ou má-fé do segurado para a implementação do risco e obtenção da referida indenização ou ressarcimento das despesas.
Sobre o assunto em foco é oportuno trazer à baila os ensinamentos de Cavalieri Filho[1], ao lecionar que:

Três são os elementos essenciais do seguro - o risco, a mutualidade e a boa-fé -, elementos, estes, que formam o tripé do seguro, uma verdadeira, “trilogia”, uma espécie de santíssima trindade.
Risco é perigo, é possibilidade de dano decorrente de acontecimento futuro e possível, mas que não depende da vontade das partes. Por ser o elemento material do seguro, a sua base fática, é possível afirmar que onde não houver risco não haverá seguro. As pessoas fazem seguro, em qualquer das suas modalidades - seguro de vida, seguro de saúde, seguro de automóveis etc. -, porque estão expostas a risco.
(...)
Em apertada síntese, seguro é contrato pelo qual o segurador, mediante o recebimento de um prêmio, assume perante o segurado a obrigação de pagar-lhe uma determina indenização, prevista no contrato, caso o risco a que está sujeito se materialize em um sinistro. Segurador e segurado negociam as conseqüências econômicas do risco, mediante a obrigação do segurador de repará-las.

Assim, o elemento volitivo supracitado gera o agravamento do risco estipulado, resultando no desequilíbrio da relação contratual, onde a seguradora receberá um prêmio inferior à condição de perigo de dano garantida, em desconformidade com o avençado, nos termos do art. 768 da lei civil.[2]

Portanto, para que esta situação ocorra, deve haver intenção do segurado, não bastando mera negligência ou imprudência deste.
De outro lado, é preciso consignar que os serviços securitários atinentes à saúde estão submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, enquanto relação de consumo, dispondo aquele diploma legal em seu art. 3º, § 2º, o seguinte:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
§ 1° (...)
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Dessa forma, há perfeita incidência normativa do Código de Defesa do Consumidor nos contratos atinentes a essa espécie de seguro, como aquele avençado entre as partes, podendo se definir como sendo um serviço a cobertura do seguro ofertada pela empresa seguradora de saúde, consubstanciada no pagamento dos prejuízos decorrentes de riscos futuros estipulados no contrato aos seus clientes, os quais são destinatários finais deste serviço.
Assim, aplica-se a lei consumerista a relação de consumo atinente ao mercado de prestação de serviços médicos. Isto é o que se extrai da interpretação literal do art. 35 da Lei 9.656/98. Aliás, sobre o tema em lume o STJ editou a súmula n. 469, dispondo esta que: aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.
Ademais, releva ponderar que o contrato de seguro e plano de saúde é basicamente um acordo de transferência da titularidade dos prejuízos econômicos decorrentes da materialização do sinistro, onde aquele que toma a posição de garantidor (seguradora) se obriga ao pagamento de um valor em pecúnia ao segurado, a fim de ressarcir as despesas médicas deste, caso o sinistro relativo à saúde do mesmo venha a se perpetrar.
Portanto, é indispensável nesse tipo de avença, a confiança mútua, ou seja, a segurança de ambas as partes, no que tange ao cumprimento do pactuado.
No caso em exame pretende a parte demandante a restituição em dobro dos valores despendidos com a prótese utilizada na intervenção cirúrgica a que foi submetida, bem como indenização por danos morais devido à negativa securitária
Ao analisar os documentos insertos nos autos, constata-se que o plano de saúde aderido pela parte autora, cuja abrangência é o objeto do litígio, decorre de contrato de assistência à saúde firmado em data anterior a edição da atual Lei dos Planos de Saúde.
É oportuno ressaltar, ainda, que o referido pacto está submetido às disposições da Lei 8.078/90, como anteriormente mencionado, atinente ao mercado de prestação de serviços médicos, conforme se extrai da interpretação do art. 35 da Lei 9.656/98.
Frise-se, ainda, que o Código de Defesa do Consumidor, ao instituir os direitos básicos do consumidor, definiu no seu art. 6º, inciso III que:
(...)
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
(...)

Assim, a norma precitada assegura ao consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, bem como sobre os riscos que apresentam. Portanto, no caso sub judice, há evidente desobediência ao dispositivo legal em comento, na medida em que as informações sobre o serviço que estava sendo contratado não foram prestadas de forma adequada.
Pondere-se, ainda, que a incidência das regras definidas na Lei n.º 9.656/98, mesmo que a empresa contratante do plano objeto do presente litígio não tenha optado por migrar de plano, não ocasiona ofensa a ato jurídico perfeito, pois não se trata de aplicação retroatividade do referido diploma legal, mas mera adequação do contrato a esse regramento jurídico, pois em função do seu caráter de ordem pública, tem a normatização em questão aplicação imediata. Nesse sentido são os ensinamentos de Orlando Gomes[3]:

A mais importante questão no exame da continuidade de um contrato por tempo determinado consiste em saber se o contrato persiste ou se outro lhe sucede.
Para resolvê-las, separam-se duas hipóteses: 1º ) se as partes conservam as cláusulas, limitando-se a dilatar o prazo de vigência da relação jurídica, numa palavra, prorrogá-lo, não haverá formação de novo contrato. É o mesmo contrato que continua, sujeito, ou não, a novo termo; 2º) se introduzem, entretanto, novas cláusulas, modificando o conteúdo do contrato originário, inclusive a relativa à duração, renovando-o, por conseguinte, terão estipulado outro contrato. Distinguir-se-ia, desse modo, a prorrogação da renovação. Ocorrendo prorrogação, um só e mesmo contrato dilatado no tempo. Verificando-se a renovação, seqüência de contratos estipulados pelas mesmas partes. Prorrogação estende a duração do contrato; renovação dá lugar a contrato novo, ainda tendo conteúdo idêntico ao precedente.

Assim, não há que se falar em violação ao princípio da irretroatividade das leis, uma vez que em se tratando de contrato de longa duração, o qual se renova, de regra, anualmente e de forma automática, obrigação esta de trato sucessivo, também denominado de contrato cativo, segundo a nomenclatura adotada por Cláudia Marques, devem as estipulações fixadas no curso deste atender a regulação atinente a cada novo período. 
Dessa forma, mesmo que o contrato tenha sido celebrado anteriormente a sua vigência, a relação havida entre as partes deve sofrer os efeitos da nova lei, conforme preleciona a Professora Cláudia Lima Marques[4]:

Os comuns limites e/ou restrições a procedimentos médicos (consultas, exames médicos, laboratoriais), especialmente limitando as internações hospitalares, permanência em UTI’s e similares, presentes nos contratos anteriores à lei e agora excluídos expressamente pelos arts. 10 e 12 da Lei nº. 9.656/98 encontram sua base em cláusulas contratuais. Estas cláusulas contratuais são nulas por contrárias a boa-fé, como esclarece a própria lei, pois criam uma barreira à realização da expectativa legítima do consumidor, contrariando prescrição médica, criam um desequilíbrio no contrato ao ameaçar o objetivo do mesmo, que é ter o serviço de saúde que necessita.

Portanto, aplicável ao caso em exame o art. 10, inciso VII, da legislação dos planos de saúde, que veda a exclusão da cobertura securitária o fornecimento de próteses, ortóteses e seus acessórios, quando essenciais ao ato cirúrgico.
No que concerne ao tema em análise a jurisprudência desta Corte tem se manifestado reiteradamente neste sentido, tendo deixado assentado que:
  AÇÃO DE COBRANÇA. PLANO DE SAÚDE. EXCLUSÃO DA COBERTURA DE IMPLANTAÇÃO DE PRÓTESE VINCULADA A ATO CIRÚRGICO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA E DE ILEGITIMIDADE ATIVA. O juiz nunca esteve adstrito à causa de pedir remota ¿ legislação ¿, mas apenas à causa de pedir próxima ¿ fatos ¿ alegada pela parte. Assim, a invocação de lei não alegada pela autora não constitui cerceamento de defesa. O beneficiário do plano de saúde tem legitimidade para discutir a validade das cláusulas do contrato porquanto é considerado o efetivamente contratante na medida em que paga a contraprestação, sendo, inclusive, equiparado a consumidor. CONTRATO RENOVADO AUTOMATICAMENTE SOB A ÉGIDE DA LEI NOVA. INCIDÊNCIA DA LEI 9.656/98. DIREITO AO REEMBOLSO RECONHECIDO. PREQUESTIONAMENTO. O contrato foi prorrogado automaticamente e, por isso, deve-se sujeitar à L. 9656/98. Frente ao artigo 10 desta Lei, é inválida a cláusula excludente da cobertura em caso de prótese. O prequestionamento quanto à legislação invocada fica estabelecido pelas razões de decidir, o que dispensa considerações a respeito, uma vez que deixo de aplicar os dispositivos legais tidos como aptos a obter pronunciamento jurisdicional diverso do que até aqui foi declinado. RECURSO IMPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71001015445, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Maria José Schmitt Santanna, Julgado em 05/06/2007).

APELAÇÃO CÍVEL. SEGUROS. PLANO DE SAÚDE. CARACTERIZAÇÃO DE IMPLANTE E NÃO DE PROTESE COMO ALEGA A DEMANDADA. CONTRATO FIRMADO ANTERIORMENTE À VIGENCIA DA LEI 9.656/98. EXCLUSAO DA COBERTURA DE ÓRTESE E PRÓTESE. CONTRATO DE TRATO SUCESSIVO. DEVER DA SEGURADORA DE OPORTUNIZAR AO SEGURADO A ADAPTAÇÃO DE SEU CONTRATO AOS DITAMES DA LEI SUPERVENIENTE. APLICAÇÃO DO CDC E LEI 9.656/98. NULIDADE DA CLÁUSULA DE EXLUSAO DO PROCEDIMENTO. CONDENAÇÃO DA SEGURADORA AO RESSARCIMENTO DAS DESPESAS. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. IMPOSSIBILIDADE. - A relação havida entre as partes se dá sob a égide do Código de Defesa do Consumidor. - Mesmo que ausente comprovação de que se tratava de caso de implante, deveria a ré arcar com os custos do procedimento, segundo interpretação acima esposada, sendo que o art. 10, VII, da Lei 9.656/98, é claro ao estabelecer que não poderão ser excluídos da cobertura do plano de saúde o fornecimento de próteses, órteses e seus acessórios. - A seguradora não pode sofrer a penalidade disposta no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que prevê a repetição em dobro, pois agiu no seu direito de negar a cobertura, fundamentadamente. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Cível Nº 70014165039, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Artur Arnildo Ludwig, Julgado em 19/04/2007).

SEGURO. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA DE IMPLANTE DE PRÓTESE. Interpretam-se em favor do consumidor as cláusulas contidas em plano de saúde, que dizem respeito às despesas excluídas, e que se encontram amplamente obscuras e de difícil interpretação, considerando, especialmente, que o público alvo destas espécies de contratos não possui conhecimento específico para interpretá-las. A cláusula que determina a exclusão de cobertura de despesas decorrentes de ¿aparelhos estéticos ou protéticos de qualquer natureza¿ é vaga e imprecisa quanto à sua extensão, cujo teor é capaz de induzir em erro o consumidor. Hipótese em que a avença foi firmada antes do advento da Lei nº 8.078/90 e da Lei 9.656/98, mas, renovada anualmente, sem que a seguradora tenha provado o oferecimento de coberturas suplementares ao segurado, não há como negar a sua incidência, impondo-se a condenação da ré ao pagamento das despesas suportadas pelo apelante. Implante de próteses nos joelhos, sem fins estéticos. Dano moral indevido. APELO PROVIDO EM PARTE, POR MAIORIA. (Apelação Cível Nº 70011954203, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leo Lima, Julgado em 25/08/2005).

PLANO DE SAÚDE. UNIMED. IMPLANTE DE PRÓTESE NO QUADRIL. ADAPTAÇÃO DO CONTRATO À LEI Nº 9.656/1998. NECESSIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. 1. As seguradoras e operadoras de planos de saúde têm o dever de oportunizar a adaptação dos contratos antigos à Lei nº 9.656/1998. 2. Quando não oferecida a opção de migração ao consumidor, impõe-se a adaptação dos contratos, pois, de outro modo, estar-se-ia violando de seus direitos básicos, previstos no art. 6º, incisos II e IV e VIII, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. 3. As próteses e acessórios ligados aos atos cirúrgicos estão, em princípio, abrangidos pelo ¿plano ou seguro-referência¿ disposto no art. 10, caput, da Lei nº 9.656/98. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70021771522, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Paulo Sérgio Scarparo, Julgado em 05/12/2007).

                        Releva destacar, ainda, que o Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de que é abusiva a cláusula que exclui da cobertura a colocação de próteses em ato cirúrgico coberto pelo plano de saúde.
A interpretação aqui é simples: se havia previsão contratual da cirurgia englobando o procedimento adotado pela autora, não há como impor ao consumidor o pagamento de um dos componentes essenciais desta operação - a prótese - tendo em vista que, sem ela, obviamente, não seria possível a realização desta. Nesse sentido são os arestos do STJ a seguir transcritos: 

PLANO DE SAÚDE - ANGIOPLASTIA CORONARIANA - COLOCAÇÃO DE STENT - POSSIBILIDADE.
- É abusiva a cláusula contratual que exclui de cobertura a colocação de stent, quando este é necessário ao bom êxito do procedimento cirúrgico coberto pelo plano de saúde.
(REsp 896.247/RJ, Rel. Ministro  HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 21.11.2006, DJ 18.12.2006 p. 399).

Plano de saúde. Prostatectomia radical. Incontinência urinária.
Colocação de prótese: esfíncter urinário artificial.
1. Se a prótese, no caso o esfíncter urinário artificial, decorre de ato cirúrgico coberto pelo plano, sendo conseqüência possível da cirurgia de extirpação radical da próstata, diante de diagnóstico de câncer localizado, não pode valer a cláusula que proíbe a cobertura.
Como se sabe, a prostatectomia radical em diagnóstico de câncer localizado tem finalidade curativa e o tratamento da incontinência urinária, que dela pode decorrer, inclui-se no tratamento coberto, porque ligado ao ato cirúrgico principal.
2. Recurso especial conhecido e desprovido. (REsp 519.940/SP, Rel. Ministro  CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 17.06.2003, DJ 01.09.2003 p. 288).

Portanto, o contrato de adesão em tela foi avençado entre as partes com o objetivo de garantir o pagamento ou o reembolso a segurada ou ao seu beneficiário caso ocorresse algum dos eventos cobertos pelas garantias do plano de saúde contratado. Não podendo o risco assegurado ser cindido, entre mão de obra (médicos, enfermeiros, etc.), local da prestação do serviço (salas de cirurgia, de recuperação, etc.), material permanente (bisturis, pinças e demais equipamentos cirúrgicos), material circulante (luvas, próteses, etc.), para fins de pagamento da indenização, como se todos estes fatores não fizessem parte do mesmo procedimento.
Logo, a interpretação mais adequada ao referido pacto, sob o ponto de vista teleológico, deve levar em conta a natureza do procedimento clínico realizado e a essencialidade do material empregado neste, a fim de ser preservada a vida, valor maior a ser resguardado.
Assim, a exclusão de prótese e/ou órtese de qualquer espécie é abusiva, conforme definido nos incisos I e VII do art. 10 da Lei nº 9.656/98, ofendendo o inciso IV do art. 51 do CDC, salvo se empregadas para fins estéticos ou não ligadas ao ato cirúrgico.
No caso, portanto, a utilização da prótese era indispensável ao ato cirúrgico levado a efeito, mostrando-se devida a cobertura securitária.
Da repetição simples
O artigo 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor estabelece que  o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Entretanto, não há se falar em aplicação do mencionado dispositivo, porquanto o consumidor não foi cobrado pela ré em quantia indevida.
No presente feito o que ocorreu foi a negativa desta em custear a prótese com base em cláusula contratual posteriormente invalidada por decisão judicial. Assim, não restou preenchido o suporte fático para incidência da mencionada regra, tendo em vista que não se trata de cobrança indevida, mas de não ressarcimento de valores despendidos com o tratamento médico feito, em função de interpretação dada ao contrato avençado entre as partes.
Da indenização por danos morais
Com relação à indenização por danos morais, entendo que no caso dos autos merece guarida a pretensão da parte autora, tendo em vista que em se tratando de seguro e plano de saúde a contratação é feita com base no princípio da boa fé, ou seja, a parte contratante segurada, espera que tenha pronto atendimento juntamente com os seus beneficiários exatamente no momento que está mais fragilizada devido ao seu estado de saúde.
Portanto, é indispensável nesse tipo de avença, a confiança mútua, ou seja, a segurança de ambas as partes no que tange ao cumprimento do pactuado. Note-se que aqui reside a principal obrigação da empresa seguradora de saúde, ou seja, a de garantir o risco concretizado nos termos do contrato entabulado, pois a parte que realiza um seguro ou plano de saúde nutre a justa expectativa de estar assegurada a sua tranqüilidade na hipótese de ocorrer o evento danoso, com o pronto e justo ressarcimento da perda havida, e não ficar envolvido numa interminável discussão jurídica protagonizada por quem deveria assegurar o bem estar daquele que necessita de serviços médicos para recuperar a sua saúde, oportunidade na qual foi prestado o desserviço de criar mais um problema para quem está com o aparelho psíquico fragilizado pela enfermidade.
A par disso, é importante ressaltar que quando a operadora do plano de saúde contrata se obriga a prestar toda a assistência para o restabelecimento do segurado, recebendo a contrapartida, por vezes por largo período de tempo sem nada despender com este, de sorte que tem provisão suficiente para arcar com as despesas médicas garantidas de acordo com os riscos previstos e capital formado, não podendo no momento de proceder à liquidação da obrigação devida criar dificuldades para se locupletar com a demora no cumprimento do contrato.
Assim, na hipótese discutida no presente feito não se trata apenas de mero descumprimento contratual, mas de desatendimento a obrigação assumida que gera profunda dor psíquica, diante da incerteza de ter recuperada a própria saúde ou a de ente querido beneficiário do plano, em função de que a ré que estava obrigada a prover os recursos necessários para o tratamento médico devido e se omite neste momento delicado.
Dessa forma, é fato notório o abalo psicológico que sofre o usuário de plano de saúde réu ante ao descumprimento da obrigação de arcar com as despesas médicas por parte deste, situação que afeta o equilíbrio psicológico do indivíduo e caracteriza o dever de indenizar, pois ultrapassado o mero dissabor no trato das relações sociais, importando em desrespeito ao princípio da dignidade humana e, como tal, atingindo os direitos à personalidade do qual integra este.
A esse respeito é oportuno trazer à colação os ensinamentos do jurista Cavalieri Filho[5] ao asseverar que:

Por mais pobre e humilde que seja uma pessoa, ainda que completamente destituída de formação cultural e bens materiais, por mais deplorável que seja seu estado biopsicológico, ainda que destituída de consciência, enquanto ser humano será detentora de um conjunto de bens integrantes de sua personalidade, mas precioso que o patrimônio, que deve ser por todos respeitada. Os bens que integram a personalidade constituem valores distintos dos bens patrimoniais, cuja agressão resulta no que se convencionou chamar de dano moral. Essa constatação, por si só, evidencia que o dano moral não se confunde com o dano material; tem existência própria e autônoma, de modo a exigir tutela jurídica independente.
Os direitos a personalidade, entretanto, englobam outros aspectos da pessoa humana que não estão diretamente vinculados à sua dignidade. Nessa categoria incluem-se também os chamados novos direito da personalidade: a imagem, o bom nome, a reputação, sentimentos, relações afetivas, aspirações, hábitos, gostos, convicções políticas, religiosas, filosóficas, direitos autorais. Em suma, os direitos da personalidade podem ser realizados em diferentes dimensões e também podem ser violados em diferentes níveis. Resulta daí que o dano moral, em sentido amplo, envolve esse diversos graus de violação dos direitos da personalidade, abrange todas as ofensas à pessoa, considerada esta em suas dimensões individual e social, ainda que sua dignidade não seja arranhada.

Aliás, as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça pacificaram a questão acerca da existência de dano moral em virtude da negativa injustificada de cobertura pelo plano de saúde, reformando inclusive acórdãos deste Colegiado e da Sexta Câmara Cível:
Civil e Consumidor. Recurso Especial. Ação de reparação por danos materiais e compensação por danos morais. Embargos de declaração. Omissão, contradição ou obscuridade. Inexistência. Negativa ilegal de cobertura, pelo plano de saúde, a atendimento médico de emergência. Configuração de danos morais.
- Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração.
- Conquanto a jurisprudência do STJ seja no sentido de que o mero inadimplemento contratual não ocasiona danos morais, esse entendimento deve ser excepcionado nas hipóteses em que da própria descrição das circunstâncias que perfazem o ilícito material é possível se verificar consequências de cunho psicológico que são resultado direto do inadimplemento.
- A recusa indevida à cobertura médica ocasiona danos morais, pois agrava o contexto de aflição psicológica e de angústia sofrido pelo segurado.
- Neste processo, a infundada recusa na cobertura do plano de saúde ocorreu após a realização dos procedimentos médicos necessários, ou seja, o paciente teve seu atendimento médico realizado e, durante o período de recuperação cirúrgica, a cobertura foi negada.
- Essa particularidade, todavia, não ilide o reconhecimento dos danos morais, pois, de acordo com o conjunto fático dos autos, a segurada foi submetida a elevado sofrimento psicológico, depois de um procedimento cirúrgico de emergência.
Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (REsp 1072308/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/05/2010, DJe 10/06/2010)

CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA. NEGATIVA. PROCEDIMENTO DE URGÊNCIA. DANO MORAL. CABIMENTO. RECURSO PROVIDO.
I. A recusa da cobertura de procedimento médico-cirúrgico por parte de prestadora de plano de saúde enseja dano moral quando aquela se mostra ilegítima e abusiva, e do fato resulta abalo que extrapola o plano do mero dissabor.
II. Caso em que a situação do autor era grave e o risco de sequelas evidente, ante a amputação, por necrose, já ocorrida em outro membro, que necessitava urgente de tratamento preventivo para restabelecer a adequada circulação.
II. Recuso especial conhecido e provido. (REsp 1167525/RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 22/03/2011, DJe 28/03/2011)

DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVOS REGIMENTAIS. RECUSA DE TRATAMENTO DE SAÚDE. DANO MORAL CONFIGURADO. PRECEDENTES DESTA CORTE. DANOS CONTRATUAIS. JUROS MORATÓRIOS A PARTIR DA CITAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SEGUNDO AGRAVO REGIMENTAL. VALOR DO DANO MORAL. IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO VALOR. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONTEÚDO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.
1. A recusa indevida à cobertura pleiteada pelo segurado é causa de danos morais, pois agrava a sua situação de aflição psicológica e de angústia no espírito.
2. Os juros moratórios nesse caso são contados a partir da citação válida.
3. Impossível alterar o valor da condenação dos danos morais fixados pelo Juiz Primevo sem reexaminar o conteúdo fático-probatório, Incidência da Súmula 7/STJ.
4. Primeiro agravo regimental conhecido e em parte provido e segundo agravo regimental improvido.
(AgRg no Ag 1085240/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 08/02/2011, DJe 15/02/2011)

AGRAVO REGIMENTAL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - RECUSA NO FORNECIMENTO DE APARELHO INERENTE AO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO - DANO MORAL CARACTERIZADO -  ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE –  RECURSO IMPROVIDO. (AgRg no Ag 1141469/PR, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/11/2010, DJe 03/12/2010)

                        Do quantum a ser fixado para indenização por dano moral
                        Com relação ao valor a ser arbitrado a título de indenização por dano moral há que se levar em conta o princípio da proporcionalidade, bem como, as condições do ofendido, in casu, beneficiária da gratuidade judiciária, a capacidade econômica da empresa ofensora, a qual se trata de operadora de plano de saúde. Acresça-se a isso a reprovabilidade da conduta ilícita praticada e, por fim, que o ressarcimento do dano não se transforme em ganho desmesurado, deixando de corresponder à causa da indenização. Nesse sentido, Cavalieri Filho[6] discorre

sobre este tema, mais uma vez, com rara acuidade jurídica, afirmando que:
Creio que na fixação do quantum debeatur da indenização, mormente tratando-se de lucro cessante e dano moral, deve o juiz ter em mente o princípio de que o dano não pode ser fonte de lucro. A indenização, não há dúvida, deve ser suficiente para reparar o dano, o mais completamente possível, e nada mais. Qualquer quantia a maior importará enriquecimento sem causa, ensejador de novo dano.
Creio, também, que este é outro ponto onde o princípio da lógica do razoável deve ser a bússola norteadora do julgador. Razoável é aquilo que é sensato, comedido, moderado; que guarda uma certa proporcionalidade. A razoabilidade é o critério que permite cotejar meios e fins, causas e conseqüências, de modo a aferir a lógica da decisão. Para que a decisão seja razoável é necessário que a conclusão nela estabelecida seja adequada aos motivos que a determinaram; que os meios escolhidos sejam compatíveis com os fins visados; que a sanção seja proporcional ao dano. Importa dizer que o juiz, ao valorar o dano moral, deve arbitrar uma quantia que, de acordo com o seu prudente arbítrio, seja compatível com a reprovabilidade da conduta ilícita, a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima, a capacidade econômica do causador do dano, as condições sociais do ofendido, e outras circunstâncias mais que se fizerem presentes.

Portanto, a indenização deve ter um caráter preventivo, com o fito de a conduta danosa não voltar e se repetir, assim como punitivo, visando à reparação pelo dano sofrido. Não devendo, contudo, se transformar em objeto de enriquecimento ilícito devido à fixação de valor desproporcional para o caso concreto.
Dessa forma, levando em consideração as questões fáticas, a extensão do prejuízo, bem como a quantificação da conduta ilícita e capacidade econômica do ofensor, entendo que, no caso em concreto, a importância a título de danos morais deve ser fixada em R$ 12.000,00, de acordo com os parâmetros precitados.
Reputando que aquele montante corresponde à quantia suficiente à reparação do dano sofrido, considerando a essencialidade do serviço prestado, a condição da apelante, bem como, atendendo ao caráter reparatório e punitivo deste tipo de indenização. Aliás, nesse sentido são os arestos trazidos à colação a seguir:
SEGURO SAÚDE. COBERTURA INDEVIDAMENTE NEGADA. APELO RESTRITO À MAJORAÇÃO DO ¿QUANTUM¿ FIXADO A TÍTULO DE DANO MORAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. O ¿quantum¿ indenizatório deve ser arbitrado em patamar que ofereça compensação ao lesado, para atenuar o sofrimento havido, e inflija sanção ao causador do dano, visando a coibir a reiteração da prática de atos lesivos à personalidade de outrem. Caso em que o filho da segurada, seu dependente no contrato de seguro saúde firmado com a ré, precisou de atendimento hospitalar, em razão de problemas respiratórios, cuja cobertura foi negada pela seguradora, indevidamente, obrigando a demandante a buscar atendimento para o menor junto ao SUS. Indenização majorada para R$ 21.000,00 ¿ equivalente a 60 salários mínimos. Correção monetária a contar da data de julgamento. Juros de mora a partir da citação. Apelação provida, em parte. (Apelação Cível Nº 70015163645, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em 09/08/2006).
          
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SEGURO DE SAÚDE EM VIAGEM. DANO MATERIAL E MORAL. CONFIGURAÇÃO. DEVER DE INDENIZAR. Tendo a autora entabulado com a ré contrato de seguro saúde por ocasião de viagem internacional e, negando-se a demandada a cumprir com o que fora avençado, mostra-se viável, no caso, a condenação da ré ao pagamento de indenização por dano material e moral. O dano de natureza extrapatrimonial é ressarcível sempre e independentemente de sua origem, se contratual ou não, porquanto a Constituição Federal não faz distinção acerca natureza do dano. Hipótese na qual o valor fixado na sentença para os danos morais merece redução de 150 salários mínimos para R$ 39.000,00. Preliminar rejeitada. Apelações providas, em parte - Ver Embargos de Declaração 70009108309 (Apelação Cível Nº 70008661456, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em 20/05/2004).

SEGURO ¿ PLANO DE SAÚDE ¿ RESOLUÇÃO Nº 13 DO CONSU ¿ CONSELHO DE SAÚDE SUPLEMENTAR (LEI Nº 9.656/1998) ¿ UNIMEDE (CLAUSULA Nº 28, INC. I) ¿ CASO DE URGÊNCIA/EMERGÊNCIA ¿ EMBRIÃO SEM BATIMENTOS CARDÍACOS OU MOVIMENTOS EMBRIONÁRIOS - ABORTO INCOMPLETO ¿ NOVE MESES E DOIS DIAS DE GESTAÇÃO ¿ RISCO DE VIDA ¿ DOIS DIAS DE EVOLUÇÃO DA PATOLOGIA ¿ COBERTURA NEGADA. (1) A norma jurídica que vinculam as partes é o Contrato de Seguro Saúde, denominado ¿Plano Ambulatorial/Hospitalar, Familiar e Individual. (2) ¿Quando não há como se chegar a uma conclusão sem realização de uma perícia¿ exsurge a diretriz do art. 2º, da Lei nº 9.099/95. (2.1) Na espécie, ¿a perícia é inócua, pois o que é objeto de análise é o cumprimento de cláusulas contratuais, matéria de direito¿. (3) Extraiu, cirurgicamente, parte do seu rebento (aborto incompleto) constando dois dias de evolução da patologia. (3.1) A gestação foi interrompida com nove meses e dois dias. (3.2) Não se enquadrando contratualmente na condição de ¿evento obstétrico¿ e sim ¿caso de urgência/emergência¿, com cobertura prevista na cláusula 28, inciso I, consoante art. 47 do CDC. (4) Cabível, no caso, contrato de prestação de serviços médicos, a interpretação consoante diretrizes do CDC e ¿sobre os princípios norteadores da Teoria Geral dos Contratos (art. 47 do CDC e art. 421 e 422 do CC, conjugados). DANO MORAL PURO. (5) Evidenciada, nos autos, a culpa da ré que, por negligência, submeteu a autora a constrangimentos por injustificada negativa de cobertura, mormente havendo previsão clausurada no contrato entabulado. ¿ (5.1) A empresa deve ser zelosa na análise dos pedidos de cobertura e ter rigoroso dever de organizar e controlar seus serviços. (6) A negativa de cobertura agravou significativamente o abalo moral da demandante, mormente porque não possuía o numerário necessário; sem mencionar o que ocorreu com os familiares (7) A condenação, no caso, justifica-se mais pelo caráter punitivo, dada a evidente desorganização da demandada na análise dos pedidos de cobertura. Não se pode admitir que seja negada cobertura quando o caso é de risco de morte, mormente com previsão contratual à espécie (art. 47 do CDC). (Recurso Cível Nº 71000505388, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Maria de Lourdes G. Braccini de Gonzalez, Julgado em 18/05/2004).

SEGURO SAÚDE. CANCELAMENTO. DANO MORAL. E ILICITA A CONDUTA DA SEGURADORA QUE, DE FORMA UNILATERAL, CANCELA APOLICE DE SEGURO, CAUSANDO SITUACAO DE INSEGURANCA E ANGUSTIA AO SEPARADO, ENSEJANDO, POR ISSO, INDENIZACAO POR DANO MORAL. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 597257351, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: João Pedro Pires Freire, Julgado em 10/02/1999).

No que tange à prova do dano moral, por se tratar de lesão imaterial, desnecessária a demonstração do prejuízo, na medida em que possui natureza compensatória, minimizando de forma indireta as conseqüências da conduta da ré, decorrendo aquele do próprio fato. Conduta ilícita da demandada que faz presumir os prejuízos alegados pela parte autora, é o denominado dano moral puro.
Ressalte-se que a relação jurídica avençada no caso dos autos desborda da idéia tradicional de contrato no qual há comutatividade de prestações, com vantagens e obrigações recíprocas, na hipótese dos autos se paga pela tranqüilidade, a fim de garantir incerteza futura quanto a bem inestimável, no caso a vida, pois restabelecimento da plena saúde é o resultado esperado, logo, discutir a contrato sem justa causa com o fim de protelar o cumprimento da obrigação, importa conduta ilícita que merece imediata reprimenda e reparação.
Relava ponderar, ainda, que os paradigmas atinentes ao regular cumprimento deste tipo de contrato foram ultrapassados, resultando em efetivo prejuízo de ordem moral, atingidos direitos inerentes a personalidade da parte autora, tendo em vista a frustração da expectativa de lhe ser prestado adequadamente o serviço ofertado, ilícito contratual que ultrapassa o mero incômodo.
Assim, a demandada deve ressarcir os danos morais reconhecidos, na forma do art. 186 do novo Código Civil, cuja incidência decorre da prática de conduta ilícita, a qual se configurou no caso em tela, decorrente do inadimplemento injustificado da prestação devida, atitude abusiva na qual a ré assumiu o risco de causar lesão à parte autora, mesmo de ordem extrapatrimonial, daí ensejando o dever de indenizar.
Por via de conseqüência, o descumprimento do contrato, sem razão jurídica plausível, ou mesmo o atendimento do pacto de forma negligente, sequer atentando para garantia dada e o bem a ser preservado, importa no dever de reparar o mal causado.
Assim, a responsabilidade no caso dos autos é de ordem objetiva para reparar o dano causado à parte autora, ora apelada, consoante estabelece o art. 14 da lei consumerista precitada, tendo em vista que o procedimento adotado foi temerário, atentando a boa fé objetiva ao descumprir com o dever jurídico de bem prestar seus serviços.
Portanto, a prestação de serviço deficitária importa no dever de reparar, pois o modo pelo qual foi prestado aquele e o resultado decorrente deste atingiram a esfera físico-psíquica da parte autora, fato que prescindi de culpa. Logo, inafastável é o dever de indenizar, pois não se operou qualquer causa de exclusão do nexo causal, inexistência do defeito ou culpa exclusiva do consumidor, ônus probatório que cabia à parte demandada e do qual não se desincumbiu, na forma do art. 333, II, da lei processual civil.
Reputando que o quantum indenizatório arbitrado a título de dano moral é equivalente à gravidade do prejuízo ocasionado, de forma a compensar a vítima pela lesão causada, mostrando-se compatível com as condições examinadas no caso em tela.

III- DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento ao apelo, para condenar a ré ao pagamento da quantia de R$ 12.000,00 a título de danos morais, corrigida monetariamente desde o arbitramento e acrescida de juros de mora, a contar da citação.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais na proporção de 25% destas e honorários advocatícios em favor do patrono da ré, fixados em R$ 1.200,00, tendo em vista a natureza da causa e o trabalho desenvolvido pelos procuradores que atuaram no feito, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC. Suspensa a exigibilidade em razão de a postulante litigar sob o pálio da assistência judiciária.
Ainda, condeno a ré ao pagamento do restante das custas processuais, bem como honorários advocatícios do patrono da autora, que fixo em 20% do valor da condenação, tendo em vista o trabalho realizado pelo procurador da parte postulante, de acordo com o artigo 20, §3º, do Código de Processo Civil.
Mantendo a sentença de primeiro grau nos demais provimentos emanados daquela.

Des.ª Isabel Dias Almeida (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Romeu Marques Ribeiro Filho
De acordo com o Eminente Relator no caso que ora se cuida.


DES. JORGE LUIZ LOPES DO CANTO - Presidente - Apelação Cível nº 70043897990, Comarca de Porto Alegre: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME ."


Julgador(a) de 1º Grau: FABIANA ANSCHAU ZAFFARI


[1] |CAVALIERI FILHO, Sérgio, Programa de Responsabilidade Civil, 7ª ed., rev. e amp. SP: Editora tlas, 2007, p. 404/405.
[2] |Art. 768 - o segurado perderá o direito à garantia se agravar intencionalmente o risco objeto o contrato.
[3] GOMES, Orlando. Contratos. RJ: Forense, 2007. p. 156.
[4] MARQUES, Cláudia Lima. Conflitos de leis no tempo e direito adquirido dos consumidores de planos e seguros de saúde. In: MARQUES, Cláudia Lima (coordenadora). Saúde e responsabilidade: seguros e planos de assistência privada à saúde. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p.132
[5] CAVALIERI FILHO, Sérgio, Programa de Responsabilidade Civil, 7ª ed., rev. e amp. SP: Atlas, 2007, p. 77.
[6] Ibidem, p. 90.

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